sábado, 20 de junho de 2015

Narrativa #6: Punhos e Fúria

    Bem vindos de volta! Esta narrativa conta fatos offgame, que os jogadores não fizeram parte - ao menos não diretamente. As narrativas como esta serão um modo de mostrar as pequenas e grandes mudanças que os jogadores causaram em Tellerian, para o bem ou para o mal, assim como contextualizar cidades, povos, lugares e pessoas.
    Os fatos a partir daqui contados se referem à 2ª Temporada de Tellerian, 84 anos após a campanha original. Os personagens desta vez são: o guerreiro anão Belgest (Luis), neto de Belar, que foi personagem do mesmo jogador na Temporada anterior; Adaak (Neto), um paladino que se juntou à Ethos para se redimir de ter causado a morte da própria família num acesso de fúria sobrenatural; o clérigo Érebor (Eddie), com um passado sombrio e uma conexão simbiótica com um espírito das trevas chamado de Umbra; Raduh (Caio), um draconato verde exilado, que se juntou a Resistência Arcana e se tornou um cavaleiro rúnico com poderes das trevas [vocês o verão aqui no blog através de seu diário]; Lilrelei, ou Liu, (Mateus), um ladino explorador meio elfo, irmão de Ellian (Marcela), uma meia elfa como o irmão, mas com um espírito sanguinário de bárbara; e Miryo (Sara), uma ranger desertora da Ethos, cuja família foi assassinada pela própria instituição, fato que ela descobriu tardiamente.

Narrativa #6 - Punhos e Fúria

   Como uma sombra, Murdock se moveu sobre os telhados, saltando de casa em casa na direção da Veridiana. Subiu num grande prédio do Centro; era apenas uma silhueta escura contra o céu estrelado.

   A lua minguante era pouco mais que um fio prateado no céu, um sorriso travesso entre as constelações. Nuvens escuras se moviam juntas, vindas do norte, trazendo as primeiras chuvas do outono.

   O justiceiro sentiu o vento frio soprar com força e voltou a correr, saltando para o próximo edifício e para o seguinte, na direção da parte alta de Pedrabranca.
   Chegava à Colina quando ouviu os gritos desesperados de uma mulher. Não pensou duas vezes e imediatamente seguiu na direção da voz, saltando para a rua e correndo velozmente pela rua calçada de pedras brancas.

   Murdock vestia roupas negras e faixas escuras estavam enroladas em seus punhos; a face estava coberta por uma máscara preta que só permitia ver seus olhos. E foi assim que o viram quando entrou no beco, arremetendo contra um homem e lançando-o ao chão.

   - Larguem-na! – Ordenou ele para os quatro homens que arrastavam uma senhora à força.

   Os homens obedeceram e, aturdida, a mulher levantou e correu. Murdock deixou que ela passasse por ele, fugindo para a rua, então foi lentamente cercado pelos criminosos. Posicionou defensivamente sem movimentos bruscos. Um pesado pingo de chuva acertou seu ombro e outro tocou sua nuca com um dedo frio. A chuva caiu subitamente e seus inimigos avançaram.
   Moviam-se velozmente, mas seu passo era estranho, como se estivessem embriagados. Com a agilidade própria de um monge, Murdock evadiu de socos, revidando com golpes certeiros nas costelas. A chuva caia torrencialmente e seus punhos se chocavam com a carne dos adversários num ritmo frenético. Trovões reverberavam a ponto de fazê-los tremer e os relâmpagos lançavam flashes de luz, rasgando o céu com fios de luz branca e azul.
   Uma sequência furiosa de golpes levou um ao chão e, sem parar, o monge negro se voltou para o próximo, então para o seguinte. Em dois minutos todos estavam caídos.

   - Estou farto de vermes como vocês. – disse Murdock.

   - Você nunca viu ninguém como eles. – respondeu uma voz macia e melodiosa vinda da escuridão.

   Outro relâmpago cortou as nuvens e a luz revelou um jovem saindo de uma viela lateral. Ele caminhava na direção do monge, com um sorriso estranho que provocou calafrios em Murdock. Ao som da voz dele, os homens caídos se ergueram. Tinham os olhos iluminados em rubro por alguma magia macabra. Em meio à chuva, outros surgiram vindo da rua atrás do justiceiro e das vielas estreitas e tortas em volta.
   Investiram contra ele e Murdock golpeou à direita e à esquerda, girando no próprio eixo para derrubar um inimigo após o outro. Naquela rua estreita, precisava dar cambalhotas sobre os que caíam para continuar a lutar contra o que permaneciam de pé. Começava a se sentir exausto quando o último deles caiu..

   Ofegante, o justiceiro viu o garoto sorrindo para ele da entrada do beco. Deu dois passos na direção dele, sentindo a água gelada escorrer através de suas roupas.
   Antes que pudesse avançar contra aquele mago, o som de muitas vozes em agonia tomou a rua. Gritos aberrantes que penetraram seus ouvidos. Tão agudos e lacerantes que nem mesmo o ribombar de um trovão os encobriu.
   O jovem tinha os braços abertos e cantava numa língua estranha. Murdock viu-se paralisado. Seu coração estava acelerado e o monge não entendia o motivo.

   Um corpo se ergueu no ar como se puxado por linhas invisíveis. Seus membros se retorceram em posições estranhas por alguns segundos enquanto aquelas vozes desesperadas gritavam palavras desconexas. O corpo se debateu intensamente pelo que pareceu uma eternidade, então os gritos cessaram e ele desabou.

   Murdock encarou a cena perplexo. Conhecia das artes das trevas, mas nunca vira algo assim.

   O jovem baixou os braços lentamente e o corpo se mexeu. Pálido e com olhos completamente enegrecidos, o cadáver se ergueu. Quando falou, foi como se uma dúzia de vozes saísse de sua boca:

   - Nós somos Varag. – disse ele. – Resistir é inútil.

   Murdock não esperou que aquela criatura agisse e saltou contra ele, desferindo uma sequência de golpes que o inimigo defendeu com habilidade e músculos rígidos como aço.
   Quando Varag contra-atacou, o golpe atingiu o peito do monge com força suficiente para atirá-lo contra a parede do beco. Antes mesmo que ele se recuperasse do impacto, Varag o acertou novamente e outra vez. A dor o ensurdeceu e ele sentiu a força escapar.

   Murdock desabou e sentiu a chuva atingir seu rosto. A escuridão o envolveu por um segundo, mas o justiceiro retomou a consciência bem a tempo de rolar e evadir do golpe que o inimigo desferiu contra seu rosto.
   Pondo-se de pé, o monge atacou velozmente o inimigo, numa brutal sequência de socos que derrubaria o maior dos homens, mas Varag pouco fez além de dar alguns passos para trás.

- Seus socos não podem feri-lo, imortal. - Disse o jovem.

    Murdock virou-se de súbito. Não vira o jovem passar por ele em nenhum momento.

   - Ele é um draugar. Armas mundanas não lhe causam mais que irritação. – Os olhos do jovem brilhavam em vermelho.

   Antes que pudesse responder ao mago, o justiceiro viu-se obrigado a recuar, esquivando-se dos ataques furiosos do homem de olhos negros. Preparava-se para contra-atacar quando uma lâmina perfurou suas costas. A dor fez seu passo vacilar e Varag o acertou em cheio no rosto, quebrando-lhe o nariz e levando-o ao chão.
   Tropeçando para se pôr de pé, Murdock levantou o rosto apenas para ver todos os homens que derrubara novamente prontos para o combate. Agora via que muitos tinham ferimentos fatais e membros em posições escrotas.

   Um relâmpago lançou sua luz sobre a rua e Varag se moveu como uma flecha, acertando Murdock com uma joelhada no peito. O justiceiro evitou os ataques seguintes, revidando inutilmente. Cercado, não pode esquivar de facadas desferidas por todos os lados. Girou nos calcanhares, atingindo mandíbulas e costelas, abrindo espaço na rua.
   A chuva fazia suas roupas pesarem. Lento, não pode evitar que outra lâmina trespassasse suas costelas. Tentou golpear o atacante, mas Varag segurou seu pulso, torcendo-o.
 
   Murdock viu-se gritando. Estava de joelhos e cercado. A chuva caindo, trovões ribombando. Duas dúzias de mãos tentavam alcançá-lo com facas nas mãos.
   O draugar segurava seu pulso com um aperto férreo, fulminando-o com um olhar negro como a mais negra das sombras.

   Varag deixou que fosse apunhalado meia centena de vezes, então o ergueu pelo pescoço até que seus pés não tocassem o chão. O monge tentou escapar, mas o draugar era por demais forte. Murdock o atingiu com socos no rosto, mas foi como acertar uma parede de pedra.
   Olhando fundo nos olhos do monge com seu olhar macabro, Varag trespassou seu coração lentamente com uma espada quebrada.
   O monge gemeu de dor, sentindo o metal rasgar sua carne. A última coisa que Murdock viu antes de ser abraçado pelas trevas foi o jovem de olhos vermelhos se metamorfoseando. O mago cresceu e sua silhueta se deformou. Chifres cresceram em sua cabeça e uma cauda musculosa se esticou atrás dele. Erguendo-se sobre as casas num bater de asas, o monstro desapareceu nas cortinas de água do dilúvio, deixando para trás o monge no meio de um exército de criaturas mortas.

   - Resistir é inútil. – Disseram as vozes do draugar.

   E a morte tomou Murdock nos braços mais uma vez.

Nenhum comentário:

Postar um comentário